Temer vai a Rússia e Noruega tentar vender 1.257 km de linha férrea Norte-Sul
O presidente Michel Temer embarca esta semana para a Rússia e leva na bagagem o plano de tentar atrair os russos para participar da licitação da Ferrovia Norte-Sul. Chamada nos anos 1980 de “ferrovia que liga nada a lugar nenhum” pelo então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva ela não tem saída para o mar. Hoje, a principal dúvida dos investidores é saber como a carga transportada nessa linha vai chegar a algum porto do País. Temer oferecerá aos russos a concessão de 1.257 km de linha férrea ligando as cidades de Porto Nacional (TO) e Estrela d’Oeste (SP) construídos com R$ 10,4 bilhões em recursos públicos ao longo dos últimos 30 anos. Parte desse dinheiro foi desviado em esquemas de corrupção, o que fez com que o ministro dos Transportes, Maurício Quintella, classificasse a história da ferrovia como uma “página negra” do investimento ferroviário no Brasil.
Para chegar ao mar, a carga na Norte-Sul tem duas opções: ir ao porto de Santos (SP) passando pela Malha Paulista da concessionária Rumo-ALL ou seguir para o porto de Itaqui (MA), passando por linhas administradas pela VLI, pela estrada dos Carajás, da Vale, e pela Transnordestina. Em ambos os casos, ela precisará exercer o chamado direito de passagem, para poder circular por ferrovias de outros proprietários.
“O direito de passagem não pode ser uma liberalidade da concessionária, tem de ser uma obrigação”, disse o presidente executivo da Associação Nacional dos Usuários de Transportes de Carga (Anut), Luis Henrique Teixeira Baldez. Ele explicou que a Lei 13.448, que originalmente era a Medida Provisória (MP) 752, das Concessões, estabelece a obrigatoriedade do direito de passagem. “Mas ela só traz o conceito e não diz de que forma isso vai ocorrer.”
O detalhamento dessa regra deverá constar de um decreto presidencial que ainda não existe. A entidade espera ser chamada a opinar em sua elaboração. Ela quer, por exemplo, garantias de que haverá passagem para 100% das cargas transportadas. “Do contrário, isso gera uma ociosidade na ferrovia”, afirma Baldez.
Equacionado. O governo considera que, no caso da Norte-Sul, o problema do direito de passagem está equacionado. Já foi fechado um acordo entre as concessionárias, de forma que no próprio contrato de concessão estará estabelecido o volume de carga que terá direito de passagem assegurado, e a que preço. Rumo, VLI, Vale e Transnordestina assinarão aditivos a seus contratos de concessão com as mesmas garantias. E os termos constarão também da prorrogação contratual que o governo negocia com a Rumo e com a Vale.
“Acho que vai dar certo”, comentou o diretor do Movimento Pró-Logística, Edeon Vaz Ferreira. Ele considera que o reforço ao direito de passagem na nova lei das concessões foi uma medida importante não só para o concessionário da Norte-Sul, mas também para os Operadores Ferroviários Independentes (OFIs) que possam se interessar em operar cargas nessas malhas. Há, porém, dúvidas se a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) será capaz de criar condições para o direito de passagem caso os volumes de carga sejam maiores do que o previsto no contrato. “A demanda está subdimensionada”, afirmou uma fonte do setor agrícola privado. Nesse caso, a agência precisaria exigir que as concessionárias fizessem investimentos para aumentar sua capacidade. E o histórico da agência reguladora em exigir obras adicionais, pelo menos no caso das rodovias, não é bom.